É possível que a agência espacial americana tivesse segurado a informação astronômica mais importante do ano para ajudar no marketing do longa Perdido em Marte? Spoiler: Sim, mas calma.
Em uma cena do filme Perdido em Marte, o ator Jeff Daniel, que interpreta o diretor da Nasa, diz: “Quando alguma missão falha, as pessoas esquecem do por que voamos para o espaço”. A fala não é um conselho de mãe com roupagem astronômica.
De fato, como escreveu o psicólogo americano Roy F. Baumeister, da Universidade da Flórida, em um artigo para o The Review of General Psychology, acontecimentos ruins têm um impacto maior do que os bons no nosso cérebro.
Por isso, não será surpresa se você sair da sessão do novo filme de Ridley Scott com três grandes dúvidas: 1) “Peraí, o Matt Damon desnutrido empurrou a tampa de um foguete de 400 kg com as costas?”; 2) “Os astronautas fazem reparações do lado de fora das espaçonaves, em órbita, sem nem uma cordinha para segurar? Eles não assistiram ao filme Gravidade?”; e 3) “Será que o longa é uma grande propaganda da Nasa?” Provavelmente, a resposta para a última questão é não, mas nem por isso deixa de fazer sentido.
Qualquer pessoa mais atenta deve ter achado estranho o fato de a agência espacial americana ter divulgado a existência de água em Marte exatamente na mesma semana do lançamento do filme.
Seria possível que a Nasa tivesse segurado a informação para as pessoas ficarem animadas com a possibilidade de uma viagem tripulada ao planeta vermelho e, assim, conseguir apoio público para seus programas espaciais, esquecendo possíveis futuras falhas e mantendo a chama do glamour das viagens interplanetárias acesa em nossos corações? Ou melhor: será que tudo não passa de um golpe de marketing do filme? É nessa hora que o sensor interior de teoria da conspiração explode. Mas vamos aos fatos:
1) A Nasa já era fã do livro que deu origem ao filme, escrito por Andy Weir, e trabalhou na produção do filme para garantir a precisão científica da obra. Em entrevista à revista Wired, Weir comentou: “Eles adoraram o livro e viram a obra como uma oportunidade para engajar as pessoas nas viagens espaciais”. Isso quando eles nem sabiam que Matt Damon interpretaria um colega de trabalho.
2) Enquanto o mundo estava surpreso com a descoberta marciana, Ridley Scott bocejava. O diretor do filme afirmou ao jornal The New York Times que a Nasa já havia contado a ele sobre a existência de água em Marte há dois meses. Scott disse ainda que isso teria mudado o enredo do filme, se a produção já não tivesse acabado.
3) A coincidência já aconteceu antes. Algumas versões em DVD do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, contém extras com um discurso do escritor Arthur C. Clarke, autor do livro em que o filme foi baseado, no qual ele afirma: “Nas últimas semanas, os astrônomos estão animados com as frequências de rádio vindas de um ponto entre as estrelas Vega e Altair, que devem ter uma explicação natural, mas cujas características são tão extraordinárias que ainda não há nenhuma explicação plausível”. Ou seja, bem no lançamento de 2001, na década de 1960, a Terra estava recebendo ligações de ETs? Com uma notícia assim, não seria difícil encontrar pessoas animadas em ver um filme que tratasse do assunto.
4) A Nasa planeja enviar seres humanos a Marte e ela precisa de dinheiro público para isso. Sim, a agência é um órgão do governo, e, apesar da realidade americana ser bem diferente da do Brasil, ela precisa do dinheiro dos cidadãos para sobreviver. Caso a opinião pública se voltasse contra o órgão, como eles realizariam todas as cinco missões necessárias para conseguir enviar Matt Damon, ou qualquer outra pessoa, a Marte em 2030, conforme o plano?
Nem sempre a importância de se fazer investigações espaciais são evidentes. Nem sempre são óbvios os motivos que fazem um governo aumentar em U$ 6 bilhões a verba de um programa espacial (sim, Obama fez isso!), enquanto problemas graves acontecem na Terra. Logo, como afirmou o jornal The Guardian, se os cientistas da Nasa, a indústria cinematográfica e seus respectivos assessores de imprensa têm um interessem em comum — o qual, por sinal, diz respeito a toda humanidade e ao futuro dela — por que não?
Fonte: Galileu