A forma como a vida surgiu a partir de conjuntos de produtos químicos inanimados ainda é um mistério.
Embora nunca possamos ter a certeza da composição química existente na Terra pré-biótica, podemos estudar as biomoléculas que temos hoje para obter pistas sobre o que aconteceu há três mil milhões de anos.
Cientistas usaram um conjunto dessas biomoléculas para mostrar como a vida pode ter começado. Eles descobriram que essas máquinas moleculares, que existem atualmente em células vivas, não fazem muita coisa sozinhas.
Mas, ao serem adicionados produtos químicos gordurosos, elas formam uma versão primitiva de uma membrana celular. Esta forma de auto-montagem é notável, e descobrir como isso acontece pode ser a chave para entender como a vida na Terra se formou e, talvez, como se pode formar noutros planetas.
Em 1987, o Prémio Nobel da Química foi atribuído aos químicos que mostraram como as moléculas complexas podem executar funções precisas.
Um dos comportamentos destas moléculas é a auto-organização, onde vários produtos químicos diferentes se juntam por causa das muitas forças que atuam sobre eles, tornando-as uma máquina molecular capaz de executar tarefas ainda mais complexas. Cada célula viva está cheia destas máquinas moleculares.
Na Universidade de Roma, Pasquale Stano e seus colegas ficaram interessados em utilizar este conhecimento para investigar as origens da vida. Eles escolheram um conjunto que produz proteínas, constituído por 83 moléculas de ADN diferentes, que – quando unidas – foram programadas para a produção de uma proteína verde fluorescente (GFP), que pode ser observada com um microscópio.
Tecnicamente, o conjunto só pode produzir proteínas quando as suas moléculas estão suficientemente próximas para reagir uma com a outra. Quando o conjunto é diluído em água, elas não podem reagir. Esta é uma das razões que explicam o porquê do interior das células vivas é muito lotado: para permitir que a química da vida trabalhe.
De forma a recriar essa aglomeração molecular, Stano adicionou um produto químico chamado POPC à solução diluída. Moléculas gordurosas, tais como a POPC, não se misturam com água, e quando colocados no líquido, formam automaticamente os chamados lipossomas. Estes têm uma estrutura muito semelhante à das membranas de células vivas e são amplamente usados para o estudo da evolução das células.
O investigador relata que, de forma surpreendentemente, 5 em cada 1000 lipossomas tinham todas as 83 moléculas necessárias para a produção da proteína. Estes lipossomas produziram uma grande quantidade de GFP e brilhavam a verde sob um microscópio.
Cálculos computacionais revelam que, mesmo por acaso, 5 lipossomas em 1000 não poderiam ter apanhado todas as 83 moléculas do conjunto – a probabilidade calculada é essencialmente zero, o que significa que algo bastante singular e complexo está a acontecer.
Stano e seus colegas ainda não entenderam a razão disso acontecer. De facto, pode até ser um processo aleatório que um modelo estatístico melhor possa futuramente explicar. Também é possível que estas moléculas particulares sejam adequadas para este tipo de auto-montagem, porque já estão altamente evoluídas.
Um próximo passo importante será ver se moléculas semelhantes, mas menos complexas, são capazes de tal proeza. Independentemente das limitações, a experiência de Stano demonstrou pela primeira vez que a auto-montagem em células simples pode ser um processo físico inevitável. Descobrir como exatamente isso acontece significa dar um grande passo para a compreensão de como a vida se formou.