segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Cidadela pré-colombiana opõe incorporadores a arqueólogos em Miami




Escondida no centro de Miami, no estado americano da Flórida, uma cidadela atribuída a uma etnia pré-colombiana emerge em meio a arranha-céus e shopping centers. Segundo arqueólogos, trata-se de um assentamento dos índios tequestas, que poderia datar de 2 mil a.C.

O local foi descoberto há dez anos e desde então vem provocando um debate acalorado entre o direito à propriedade privada e a conservação do legado histórico arqueológico da cidade.

Os donos do terreno dizem ter investido centenas de milhares de dólares na propriedade, enquanto os arqueólogos defendem a preservação da cidadela antiga.

Para o arqueólogo Robert Carr, encarregado do projeto, a descoberta "é pouco usual e atípica na América do Norte porque está preservada quase que de forma intacta, com os buracos cortados na rocha, que é muito dura", disse ele à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.

Fase final

O trabalho arqueólogico começou há mais de dez anos e chega, agora, à fase final. No local, os pesquisadores descobriram uma série de oito círculos concêntricos, cheios de buracos talhados na pedra pelos nativos tequestas.

O primeiro foi descoberto pouco depois do início das escavações em 2005, quando metade de um dos círculos foi desenterrada. Em 2012, o trabalho foi retomado e vem sendo realizado desde então.

Além dos buracos nas rochas, também foram encontrados traços lineares que, segundo os arqueólogos, serviriam como caminhos para a conexão entre os círculos.

"Os objetos que descobrimos nos permitem entender como era o assentamento. A madeira (que era inserida dentro dos buracos) apodreceu com o tempo, mas os registros dos buracos nas rochas estão muito bem preservados", explicou Carr.

"Nossa aposta é de que os tequestas colocavam hastes de madeira dentro dos buracos para sustentar estruturas no que acreditamos ser uma aldeia. Testes feitos com carbono 14 nos mostraram que o objeto datava do ano 600 a.C. Mas há muita informação que ainda temos de processar", afirmou ele.

O terreno onde se localiza o sítio arqueológico é um dos últimos desocupados no centro de Miami. A região é alvo de intensa especulação imobiliária e, segundo Gene Starns, porta-voz e advogado da construtora Grupo MDM, dona do terreno, centenas de milhões de dólares já foram investidos no local, cujo futuro depende agora da Justiça.

O lugar onde o sítio arqueológico foi descoberto faz parte da quarta fase de um projeto que prevê a construção de cinemas, restaurantes e um edifício residencial.

O complexo já inclui um hotel da rede Marriott, uma torre de escritórios e outra residencial sobre a Bahia de Biscayne.

O porta-voz da construtora dona do terreno assinalou que a empresa já contribuiu com US$ 3 milhões (R$ 7,3 milhões) para as pesquisas arqueológicas realizadas no local.

Propriedade privada

Arqueólogos descobriram oito círculos concêntricos com buracos nos quais hastes de madeira seriam inseridas O debate sobre a cidadela tenquesta reacende um antiga polêmica relacionada a um círculo pré-histórico similar que foi descoberto nos fins do século passado, também dentro de um projeto urbanístico privado.

Uma intensa discussão seguiu-se à descoberta, que culminou em uma manifestação que atraiu centenas de pessoas às ruas de Miami. Como resultado, o terreno acabou expropriado a um custo de US$ 27 milhões (R$ 65,4 milhões).

O local foi transformado em um parque aberto à visitação pública. Ali, foi criado um monumento com o círculo pré-histórico e hoje o lugar é conhecido como Miami Circle.

Herança cultural

Para Carr, "o melhor cenário seria preservar parte do lugar". Ele sugere uma solução que agrade ambas as partes, como um local de entretenimento que preserve o sítio arqueológico e seja aberto à visitação pública, nos moldes do que se vê "na Europa e em outras partes dos Estados Unidos, mas ainda não na Flórida".

Nesse sentido, ele propõe que um dos círculos seja fisicamente removido de lugar e seja colocado em uma área aberta ao público dentro de uma praça que recriaria o modelo de assentamento.

No entanto, o advogado da incorporadora acredite a população não apoiaria uma iniciativa similar, devido aos altos custos envolvidos no Miami Circle.

"Em Miami há um enorme respeito ao direito de propriedade. Muitas pessoas daqui vêm de Cuba e de outros países da América Latina, onde o conceito de propriedade privada muitas vezes não é respeitado", destacou Starns.

Fonte: Jornal de Arqueologia
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